Conforme avançamos para os séculos XIX e XX, o estilo clássico continuou sendo reinterpretado à luz dos contextos sociais, econômicos e tecnológicos de cada época. A era vitoriana e o movimento Art Déco representam dois momentos distintos em que o passado clássico é revalorizado e transformado — ora com nostalgia e excesso, ora com inovação e síntese.
Castelo de Balmoral, na Escócia
O estilo vitoriano se desenvolveu no Reino Unido durante o longo reinado da Rainha Vitória (1837–1901), em um contexto de prosperidade econômica, crescimento da classe média e intensificação do comércio global. Com a Revolução Industrial em pleno andamento e Londres consolidando-se como novo centro cultural e arquitetônico do Ocidente, o vitoriano tornou-se um reflexo direto desse novo momento histórico.
Inspirado em movimentos clássicos como o barroco e o rococó, o vitoriano retoma a exuberância ornamental, mas com uma linguagem própria — marcada por tons sóbrios, riqueza de materiais e um ecletismo inédito na decoração de interiores. A estética passa a ser um símbolo de status e sofisticação.
Escola Vitoriana de Artes e Ciências, em StroudFoto: Jongleur100
Características do estilo Vitoriano:
Ambientes densamente decorados, com forte presença de ornamentos, texturas e estampas;
Paleta baseada em tons escuros e quentes: madeira escura, couro, marrom, terra e tijolo, sempre enriquecidos com tecidos pesados como veludo;
Contraste dramático entre cores e padrões, com influência do barroco na teatralidade visual dos espaços;
Uso expressivo de papéis de parede, tapeçarias, cortinas volumosas e mobiliário robusto;
Iluminação com elementos de cristal e metais polidos, como bronze e latão;
Fortes referências ao gótico e ao medieval inglês, mesmo enquanto o classicismo francês suavizava suas formas;
Inserção do ferro e do aço como elementos estruturais e decorativos, refletindo os avanços da Revolução Industrial.
No Brasil, especialmente em cidades como Petrópolis e São Paulo, o estilo vitoriano foi reinterpretado pela elite cafeeira e pela influência inglesa na ferrovia e na arquitetura urbana. As casas vitorianas brasileiras trazem adaptações climáticas, como varandas com cobogós e jardins internos.
Palácio Rio Negro, no Rio de JaneiroFoto: Wilfredor
Casa das Rosas, em São PauloFoto: Reprodução
A partir do estilo vitoriano, inicia-se também uma nova fase do decorativismo: o ecletismo global. A expansão do Império Britânico trouxe ao Reino Unido uma série de influências culturais externas — especialmente da Ásia e da África — que passaram a ser incorporadas no design de interiores. Essa miscigenação estética refletia o apogeu colonial britânico e ampliava o repertório de formas, materiais e padrões.
A eclética Estação da Luz em São Paulo
Esse período se encerra com o fim do reinado da Rainha Vitória em 1901 e marca a transição para o século XX, que será moldado por uma vocação cada vez mais industrial. A Primeira Guerra Mundial acelera esse processo: novas tecnologias, maquinários e métodos produtivos surgem a partir das necessidades bélicas, alterando não só a economia, mas também os paradigmas arquitetônicos e decorativos.
Nesse novo cenário de potências emergentes, a hegemonia cultural e estética migra para os Estados Unidos, onde surge o próximo grande estilo clássico da história: o Art Déco.
O Art Déco surgiu entre a Primeira e a Segunda Guerra Mundial, consolidando-se como o principal estilo das décadas de 1920 e 1930. Ao contrário dos estilos clássicos anteriores, que se desenvolveram por séculos, o Art Déco teve um ciclo relativamente curto, mas profundamente influente. Foi uma expressão do otimismo industrial do pós-guerra, antes da chegada da Grande Depressão e da Segunda Guerra Mundial.
Na arquitetura e na decoração, o estilo traduz o espírito do progresso e da modernidade. A geometria abstrata se torna o principal recurso plástico: zigurates, raios solares, pirâmides, linhas diagonais e arcos estilizados substituem os ornamentos sinuosos e artesanais de épocas anteriores. Essa preferência por formas puras e rígidas se deve, em parte, à mecanização dos processos produtivos — máquinas ainda incapazes de replicar a complexidade dos detalhes manuais.
Jean-Louis Gaillemin
Características do estilo Art Déco:
Composição baseada em formas geométricas estilizadas, com grande presença de diagonais, traços firmes e estruturas escalonadas;
Combinação de materiais nobres e industriais: mármore, aço inox, espelhos, lacas brilhantes, vidro curvo, madeira exótica, couro e marfim;
Paleta sofisticada com tons escuros e metalizados: preto, dourado, prata, azul-petróleo e terrosos intensos;
Elementos decorativos inspirados em culturas diversas (egípcia, africana, asteca), além de um classicismo reinterpretado sob ótica moderna;
Desenvolvimento da marcenaria e da marchetaria, com móveis imponentes de linhas ortogonais e acabamento refinado.
Um dos grandes nomes do mobiliário Art Déco foi Jean-Michel Frank, que criou peças emblemáticas ao utilizar couro, madeira e marfim em composições elegantes e austeras. Seus móveis tornaram-se objetos de desejo, marcando o início de um novo decorativismo moderno no design de interiores.
Jean-Michel Frank
Chrysler Building, em Nova York
Na arquitetura, o Art Déco se expressa com força nos arranha-céus norte-americanos, como o Chrysler Building, símbolo de uma nova economia industrial e do poder corporativo dos Estados Unidos. Assim como os templos da antiguidade clássica comunicavam grandeza espiritual, esses edifícios comunicam poder econômico e tecnológico por meio de sua verticalidade e imponência.
Chrysler Building Foto: Carol M. Highsmith
Chrysler Building
No Brasil, o Art Déco deixou marcas visíveis em cidades como Rio de Janeiro, Curitiba e São Paulo. Edifícios públicos, cinemas, estações de trem e residências urbanas incorporaram esse estilo como expressão de modernidade e sofisticação.
Estilo Streamline: aerodinâmica e ilusão de movimento
Um desdobramento do Art Déco é o Streamline Moderne, estilo originado nos Estados Unidos. Nele, objetos e móveis ganham formas aerodinâmicas que sugerem velocidade, potência e tecnologia — mesmo que sua funcionalidade não tenha mudado. A estética streamlined representa um ideal de futuro e dinamismo, com curvas suaves, superfícies contínuas e uma linguagem visual inspirada na indústria automotiva e naval.
Klaus Wettergren
Terry Tynan
Tanto o estilo vitoriano quanto o Art Déco mostram como a herança clássica pode ser adaptada às exigências de diferentes tempos. Enquanto o vitorianismo traduz a nostalgia de uma Inglaterra imperial, o Art Déco representa o otimismo moderno do pós-guerra. Ambos, no entanto, continuam a dialogar com o passado greco-romano por meio de formas, padrões e simbologias.
A próxima etapa desta jornada nos levará aos estilos modernos e contemporâneos, onde o clássico é desconstruído, reinterpretado ou até negado — mas nunca ignorado.
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